quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

As condições de trabalho do setor de semi-jóia, folheado e bijuteria em Limeira


Limeira é hoje reconhecida como a capital da semi-jóia, do folheado e da bijuteria. Ao longo de aproximadamente três décadas este setor produtivo ganhou dimensões dignas de ser considerado uma das principais atividades econômicas de nossa cidade. E como tal, é notória a sua contribuição para o desenvolvimento do município, no que tange a geração de emprego e a arrecadação de divisas aos cofres públicos.

Entretanto, verifica-se neste mesmo setor da economia limeirense, o uso de mecanismos e práticas produtivas questionáveis. Visando tornar o produto competitivo nos mercados nacional e internacional sem, no entanto, reduzir a margem de lucro, desencadeou-se um intenso processo de terceirização por meio da ampliação do trabalho em domicílio. Esta estratégia produtiva, ao permitir maior exploração do trabalho excedente, contribui para o agravamento das condições deste mesmo trabalho.

A precarização do trabalho, fenômeno advindo da reestruturação produtiva do capital no Brasil, conforme a receita definida no Consenso de Washington, provocou uma onda enorme de ataques á direitos históricos conquistados pelos trabalhadores. Por aqui esta realidade salta aos olhos: Milhares de trabalhadores do setor informal de jóias, predominantemente mulheres, submetidas á condições desumanas de subemprego, sem qualquer garantia. Além dos baixíssimos salários, não há férias, 13º salário, licença maternidade, descanso semanal remunerado. Nos casos de acidentes de trabalho, ou LER (Lesão por Esforço Repetitivo) os trabalhadores ficam desguarnecidos, sem ter a quem recorrer, sem salário e sem qualquer amparo que nossa legislação poderia lhes garantir, caso estivessem formalizados em seu trabalho.

Há, ainda a ampliação do trabalho infantil, conseqüência direta da transferência do trabalho produtivo do espaço fabril para o espaço domiciliar, onde o controle do trabalho infantil fica ainda mais difícil.

Diante desta situação delicada aqui exposta, qual seria a solução viável? Eliminar o trabalho informal deixando os trabalhadores de dependem dele na miséria? Claro que não.

Entendo que, se uma pessoa não tem outra alternativa de sobrevivência a não ser aceitar um trabalho humilhante, que coloque sua saúde em risco, ou em condições semelhantes ao trabalho escravo, obviamente ela venderá sua força de trabalho por qualquer preço. Como dizia Marx: “A principal arma do capitalista é a fome do trabalhador.”

Cabe-nos então descobrir alternativas que dignifiquem o trabalho. Neste sentido, o sociólogo português Boaventura Souza Santos, tem contribuição importante. No seu livro, “Produzir para viver” ele analisa muitos movimentos e experiências em que as classes populares formularam alternativas à produção e distribuição capitalistas, por meio da criação de cooperativas populares, empresas autogestionárias, gestão coletiva, associações de desenvolvimento local, enfim, experiências de economia solidária popular.

Organizadas coletivamente, numa cooperativa de trabalho, por exemplo, as pessoas poderão se proteger, propor melhores salários, planos de saúde, previdência, assistência jurídica, adicional de salubridade, caso necessário, etc. Tudo decidido em assembléias de trabalhadores de forma democrática.

Assim, nossa cidade que já é considerada a capital da semi jóia do folheado e da bijuteria, será também uma cidade que respeita seus trabalhadores e trabalhadoras.

Ronei Costa Martins

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Vereador, um educador popular.



Há uma imagem negativa predominante na sociedade a respeito dos políticos em geral e do vereador em particular. A maioria considera que os vereadores são bem pagos para fazer pouca coisa e que eles pertencem à prefeitura. Boa parte da população não sabe qual a exata função do vereador, e forma idéia dela pelos costumes dos políticos tradicionais.
Diante deste quadro preocupante, desenhado por muitos políticos que nutriram uma relação clientelista com a população tentarei desmistificar alguns conceitos nocivos a todos nós.
Antes, porém é importante salientar: O poder legislativo, ao qual o vereador pertence é um poder independente, que tem por finalidade constitucional propor leis e fiscalizar os atos do executivo, ou seja, da prefeitura. Portanto o vereador não pode estar ligado á prefeitura, sob o ônus de ter a função de fiscalizador comprometida.
Pois bem, predomina em nossa sociedade a figura do vereador que ajuda na resolução dos problemas individuais, familiares ou do bairro para, em troca, ter o voto dos beneficiados. A regra neste tipo de relação é manter a população desmobilizada, como dependente do vereador para garantir suas necessidades supridas, situação lamentável observada nos meandros políticos de nosso país.
Esta relação clientelista, tão presente em nossos dias, além de arma eleitoral, é um dos fundamentos da corrupção. Senão vejamos: Para distribuir favores ou doações de todo tipo, que lhes são solicitados pelos seus clientes-eleitores, possivelmente o agente político tende a procurar garantir um bom volume de recursos por fora de seus vencimentos.
O clientelismo também está na base do empreguismo que incha as administrações públicas de funcionários indicados por vereadores, que lá são colocados por serem lideranças de bairros ou cabos eleitorais dos seus padrinhos políticos.
Derrotar esta prática é talvez o nosso maior desafio. E certamente a melhor forma de conter o clientelismo é mobilizar e organizar a população na conquista de direitos coletivos, para desmontar esta poderosa estrutura de corrupção e assim transformar nossas instituições públicas em instancias realmente democráticas.
Há que se apurar a sensibilidade para ser solidário com os que sofrem, porém ser solidário significa nunca perder de vista que seu sofrimento é resultado de uma sociedade desigual que joga milhares de pessoas na indigência, enquanto o estimado leitor corre os olhos sobre este artigo. Evidencia-se, portanto que a assistência (importante, afinal as pessoas tem fome e não podem esperar), não pode ser o eixo de uma atuação parlamentar, sob o risco de não atacarmos o radical de nossas dores e ficarmos na superficialidade, como que analgésicos diante de uma doença crônica.
Cabe-nos trabalhar incansavelmente para que as pessoas se aproximem, de forma organizada, e participem das decisões que as afetam diretamente, como diz Gramshi:... Diminuir a distância entre governados e governantes.
Se é verdade que o poder emana do povo, nada mais adequado do que partilhar o poder com o povo, através de Projetos de Iniciativa Popular, Plebiscitos, Referendos Populares, Orçamento Participativo, dentre outros mecanismos legítimos. Certamente esta aproximação popular da mesa de onde saem as decisões acerca do nosso futuro, inviabilizaria qualquer prática obscura de favorecimentos pessoais em detrimento da coletividade.
Eis a chave de atuação de um vereador nesta atual conjuntura: Atuar como educador popular, organizando a sociedade para que, juntos, possamos lutar na resistência a esta poderosa lógica de política tradicional que vem corroendo a democracia e nos paralisando enquanto sujeitos da história.

Ronei Costa Martins
Vereador – PT - Limeira

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

A Cabeça do Cabrito.


Era 1988. Numa manhã cinzenta de chuva miúda, Chico acordara. Levantou-se animado pelo cheiro de café que a esposa acabara de passar. Logo pela manhã havia uma reunião no sindicato. Tomou seu café sentado à mesa enquanto ouvia a chuva mansa lá fora. Também de fora, no entanto nada manso, invadiu o interior do casebre os gritos de Izamar, sua esposa. Rapidamente Chico levantou-se da mesa e correu em direção aos gritos que já haviam dado lugar ao choro, como se toda aquela chuva miúda brotasse dos olhos de Izamar. Chico viu a mulher prostrada ao chão e só entendeu seu desespero quando lentamente direcionou seu olhar do chão para a porta de entrada de sua casa. Seus olhos estalaram e um súbito receio lhe tomou a alma. Chico estava diante de uma cabeça de cabrito pendurada diante de sua porta.
Em sua luta pela defesa dos seringueiros e em favor da implantação de reservas extrativistas do Acre, Francisco Mendes já havia presenciado inúmeras ocorrências como aquela. Quem se opusesse à onda de especulação fundiária, que lançava mão de queimadas e motosserras para “limpar” a mata e retirar os seringueiros de seu meio de vida, pagava um alto preço: O próprio sangue! As ameaças vinham de forma não menos assustadora: Uma cabeça de cabrito pendurada na porta do jurado.
Naquela manhã Chico Mendes sabia que poderiam matá-lo. Ao tentarem persuadi-lo para que se retirasse daquela zona de conflito, Chico externou: “ Se a minha morte fortalecesse nossa luta até que valeria a pena. Mas a experiência nos ensina o contrário. Então eu quero viver! Mas ele não se retirou da cidade. Continuou liderando os trabalhadores rurais.
Aconteceu o que todos já sentimos. Em 22 de dezembro daquele ano, Francisco Alves Mendes Filho foi morto por um pistoleiro em sua própria casa.
Correram os anos e a ganância insaciável do homem tolo ainda faz muitas vítimas. É fato: Querer preservar o meio ambiente, defender o desenvolvimento sustentável, organizar trabalhadores rurais na busca de seus direitos é perigoso.
Afinal, que perigo ofereceria uma irmã de 73 anos de idade, além destas acima citadas? Seria ela uma ameaça à ordem estabelecida? Irmã Dorothy Mae Stang, dedicava sua vida para amenizar o sofrimento dos pobres desta terra. Desejosa por viver num mundo onde houvesse paz, não foi omissa e canalizou suas energias rumo a este intento. Afinal sabia que sua maior recompensa seria viver num mundo um pouquinho melhor.
Entre Chico Mendes e Irmã Dorothy, jazem muitas outras vítimas desta violência, motivada pela ganância predadora que assola nossas vidas. Homens e mulheres que foram mortos por sonhar com uma terra acolhedora e benfazeja.
Tolos pistoleiros! Fazendeiros e latifundiários tolos! O brilho reluzente do vil metal lhes cega os olhos. Não vêem que estão matando justamente aqueles que tentam defendê-los? Que estão matando pessoas que dedicam suas vidas à promoção do bem-estar, não somente á um povo específico, mas a toda a humanidade. Afinal, devolver dignidade às pessoas antes excluídas do direito à vida é curar um câncer na humanidade. Lutar para que todos respeitem o meio-ambiente e implantar o desenvolvimento sustentável é reconhecer que as gerações futuras têm o direito de herdar uma Terra habitável para todos os seres, companheiros nesta aventura terranal.
Acordemos todos! Os apelos externados pela Irmã, pelo Chico e por tantos outros, deve causar um certo incômodo para além da comoção por ocasião de funerais. Saibamos todos os que queremos um mundo justo: Não se alcança a paz com uma postura apática ou neutra diante da violência. A partir da indignação é preciso colocarmo-nos à disposição da construção de uma cultura de paz. Paz é diferente de passividade.
A cabeça de cabrito, como sinal de morte vindoura, há de ser pendurada na porta onde se escondem a ganância e a intolerância dos homens. Somente assim, construindo um consenso mínimo acerca de valores fundamentais ao cuidado com a vida, é que poderemos dar início a uma sociedade de paz entre todos. Por certo este era o sonho dos Chico, da Ir. Dorothy, e de muitos de nós. Então sigamos em frente alimentados pelo exemplo lutador dos nossos mártires.

Ronei Costa Martins
Veereador - PT

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

O risco de estar vereador


Ocupar um cargo eletivo e provisório, atribuição honrosa cedida pela população através do voto, traz consigo alguns perigos, que exigem atenção redobrada tanto no exercício da função, quanto fora dela.

Joaquim Maria Machado de Assis, já no início do século passado, esculpiu um alerta por meio de um poema chamado “A Mosca Azul”. Nele o poeta nos chama a atenção para o perigo de sucumbir aos encantos do poder.

A estrutura hierárquica a qual o vereador está inserido exerce um encanto que tende a, paulatinamente, convencê-lo de que ele é, nas palavras do Machado de Assis, “O rei da Cachemira, tendo sobre o colo um imenso colar de opala e uma safira”.

Começa-se com um tratamento dispensado. De repente o estranhamento: Bom dia senhor Vereador! Vossa excelência deseja algo? E não para por aí: O bom salário, o veículo oficial, o suco gelado, o gabinete, os assessores à disposição, as primeiras fileiras reservadas em todos os eventos, tudo disposto harmoniosamente no “canto da sereia”, que seduz. O resultado é previsível: Após anos vivendo sob esta atmosfera, corremos o risco de acreditar. Eis que o veneno da mosca azul pode provocar delírios febris permanentes, nos quais o enfermo acredita ganhar status de semi-deus.

Representar politicamente significa, sem sombra de dúvida, conduzir a decisão tomada pela sociedade organizada, nunca decidir por ela. O vereador deve então anular-se enquanto indivíduo isolado, para abstrair o desejo coletivo na hora de sua decisão no plenário. Fica claro, portanto que o veneno da mosca pode prejudicar o trabalho do edil e até anulá-lo, uma vez que seus efeitos provocam reações contrárias, como por exemplo, a ilusão de que se pode tomar decisões que afetam a população, sem sequer escutá-la. Como se o edil recebesse, num passe de mágica, o dom da ciência absoluta. Eis o perigo do veneno da mosca do Machado.

Felizmente há um antídoto. Porém antes é preciso reconhecer-se afetado pelo veneno. O remédio é simples, baseado nas coisas que aprendemos ao longo da vida, onde podemos encontrar as palavras do Cristo quando orienta seus companheiros: “Os reis das nações agem com elas como senhores, e os que a dominam fazem-se chamar benfeitores. Quanto a vós, nada disso. Mas o maior dentre vós tome o lugar do mais moço, e o que comanda, o lugar de quem serve. (Lc. 22,25-26).

Então, para não sucumbir aos efeitos do veneno da mosca, devemos assumir a condição de servo. Entretanto é importante qualificar o ato de servir. Que tipo de serviço o servo político deve assumir? Mas este é assunto para um outro bate papo. Por hora, busquemos assumir o compromisso de servos á serviço da população de Limeira.

Façamos da política um instrumento de transformação social!

Ronei Costa Martins
Gente amiga, revisando minhas gavetas, naquela costumeira faxina de final de ano, encontrei um poeminha que fiz lá em 2006. Neste breve texto tento construir uma interface entre as duas versões conhecidas da criação do mundo: A religiosa e a Científica. Se quiserem:

Caos
(A criação do mundo)

No desespero das horas,
A vida inexiste.
O tempo, louco, chora
O instante triste
Da ausência total.

A escuridão absoluta
O silêncio visceral,
Trazem nos braços
A dor sufocante
De não enxergar,
Porque não há o que ver!
De não escutar,
Porque não há o que ouvir!

Tudo e nada são a mesma coisa
E se fundem na falta de um lugar

* * *
Eis que grande explosão acontece,
Rompe a agonia do silêncio,
E às trevas, fenece!

Feixes de luzes dão o começo
Da dinâmica da vida
Tecida em harmonia
Na dança cósmica regida
Pelo amor de Deus!

Eis a Criação!

Ronei Costa Martins

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Receituário de precauções contra argumentações desonestas.


O filósofo Olavo de Carvalho publicou um ensaio denominado “Como Vencer um Debate sem Precisar Ter Razão”. Embora o título pareça o de um manual para os que desejam enganar o povo, de início o autor adverte dizendo que o leitor tem nas mãos um tratado de patifaria intelectual, não para uso dos patifes, mas sim de suas vítimas. O livro dedica-se a uma análise da obra “A Dialética Erística”, do filósofo Schopenhauer. Nela o filósofo faz uma análise dos esquemas argumentativos enganosos que os maus políticos utilizam, com razoável sucesso, para enganar o povo.
A Retórica, segundo eles, é a arte da persuasão, do convencimento. É capacidade de defender uma idéia articulando argumentos em favor da mesma. Já a Erística, em contrapartida, trata da artimanha de falsear argumentos usando-se de variados artifícios para se vencer um debate sem necessariamente ter razão.
Na vida pública a Retórica é uma habilidade importante. Entretanto, nota-se com freqüência a substituição da Retórica pela Erística. Na falta de bons argumentos, costuma-se recorrer aos mais variados artifícios para se vencer o debate a qualquer custo. Os apelos chegam a agredir a inteligência alheia. A manipulação de números, por exemplo, é um estratagema usado para confundir, fazendo o verdadeiro parecer falso e o falso, verdadeiro. Tal artifício foi usado, por exemplo, para convencer a população da “insignificância” do reajuste do IPTU sobre terrenos. Diziam: o aumento será de apenas um 1%, já que a alíquota saltaria de 4% para 5%. Eis aí um argumento falacioso. Um por cento num universo de quatro por cento significa 1/4 da alíquota total, portanto, 25% de aumento no IPTU e não 1% como o que foi defendido.
Ainda outras estratégias são muito utilizadas como o autoritarismo do debatedor, suas recorrentes ameaças, o apelo abusivo à condição de gênero e à idade, chegando-se às raias do apelo ao emocional. Aliás, fazer uso do aspecto emocional é uma técnica clássica para dificultar uma análise racional. É sabido que este tipo de estratégia busca abrir a porta do inconsciente afim de se implantar sensações e temores, objetivando o convencimento, não pelas idéias mas pelo apelo daquele que, sem retórica, lança mão do que lhe resta para vencer a disputa política.
A política é morada destes desejos incontroláveis. Importa pra nós conhecer tais artifícios afim de nos prevenirmos destes apelos á nossa inteligência que visam, exclusivamente, a manutenção de um sistema que de um lado oprime o povo e de outro distribui privilégios.
Fiquemos vigilantes!

Ronei Costa Martins
Vereador PT Limeira.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

A lógica dos ‘Pequenos Favores’e a Corrupção




Certa vez, às vésperas de minha posse na Câmara Municipal, estando eu na casa em que mora minha mãe, dona Maria, recebemos a visita de uma amiga dela, que, durante a prosa, sem qualquer pudor disparou: “Agora o Ronei ajeita uma casa pra você, Maria!”. A conversa terminou imediatamente tendo como desfecho a minha deselegante verborragia despejada sobre aquela senhora. Nunca mais a vi.

Passaram se dois anos e várias abordagens semelhantes me fizeram constatar que aquela senhora e outras muitas pessoas aceitariam naturalmente se eu, porventura, utilizasse a autoridade política para furar fila e conseguir uma casa para Dona Maria, minha mãe, mesmo que, para tanto, o direito à moradia fosse negado às outras pessoas mais carentes do que ela.

Deduzi ainda que a tolerância àquilo que é ilegal e imoral pudesse ser alimentada pelo desejo da extensão do possível ‘favor’ àquela senhora e demais pessoas do entorno, ou seja: Sei que é errado, mas se eu for beneficiado, concordarei, fazendo vistas grossas.

Notei que vivemos em meio à um equívoco grave: Tendemos a considerar corrupção as ações que resultem em grande impacto financeiro, e que, preferencialmente, sejam praticadas pelo outro. Tendemos então a aceitar as pequenas atitudes lesivas ao conjunto da comunidade, desde que o indivíduo que observa e julga seja diretamente beneficiado por ela.

Este senso perverso de naturalidade, tão arraigado em nossa sociedade, ganha contornos bárbaros quando verificado no atacado.

Milhares de pedidos de ‘pequenos favores’ chegam ao gabinete do vereador. Desde água potável para eventos religiosos até fretes de ônibus para viagens, passando por pedidos de vantagens nas filas do sistema de saúde, educação e habitação. Estes pedidos desvirtuam a vocação do parlamento e alimentam a máquina da corrupção na medida em que o agente político é levado a contrariar os padrões normativos, visando extrair dividendos e recompensas em seu favor.

Segundo Norberto Bobbio em seu livro “O Dicionário Político”,a corrupção é um fenômeno pelo qual um funcionário público ou o político é levado a agir de modo diverso dos padrões normativos do sistema, favorecendo interesses particulares em troca de recompensas. Este conceito, esculpido pelo sociólogo permite-nos apurar a nossa percepção acerca daquilo que seria a corrupção.

Sejamos, portanto, criteriosos em nossa análise, sem nunca perder de vista que o solicitante dos ‘pequenos favores’, na medida em que o faz, contribui para manter a máquina da corrupção a todo vapor. Combater esta lógica perversa é o nosso maior desafio. Quem vem junto?


Ronei Martins

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

O Baú de Memórias



A memória é a faculdade de conservar e lembrar de coisas passadas e tudo quanto se ache associada à elas. Preservar a memória é garantir a identidade, seja da sociedade, seja de um grupo, ou mesmo de um indivíduo.

Éramos um grupo de jovens da Pastoral da Juventude. Em 2.002, decidimos enterrar, no Morro Azul, um baú de madeira, hermeticamente fechado, dentro do qual restou depositado objetos pessoais, recortes de jornal, uma fotografia e uma carta para si mesmo. A cerimônia foi emocionante. Subimos até o morro, numa caminhada simbólica, em que aconteciam paradas para reflexão. No local destinado, cada um de nós ao depositar seus pertences no baú relatou as razões de sua escolha e também as expectativas do reencontro, que viria acontecer dez aos mais tarde, em 2.012.

Nosso grupo de então, se encontrava semanalmente para debater os assuntos relativos ao universo juvenil que envolvia desde temas como a afetividade e sexualidade até o compromisso social e político que todos devíamos assumir. O grupo proporcionava um espaço no qual podíamos externar nossas angustias, medos e sonhos, na certeza de que ali encontraríamos outros jovens para partilhar daquilo tudo. Experimentávamos um sentimento de pertença que, aos poucos, revelava a nossa identidade, enquanto indivíduo, num primeiro momento e depois na condição de sociedade. Éramos lapidados pela vivência coletiva da fé cristã.

E esta vivencia, ano após ano, estreitava os vínculos afetivos entre todos nós. Sabíamos, entretanto que a ação inexorável do tempo não pouparia ninguém. A vida nos conduziria à rumos distintos fazendo com que cada um e todos buscassem trilhar seus próprios caminhos. Diante disso decidimos promover uma situação que mantivesse os nossos vínculos mesmo que distantes uns dos outros. Surgiu então a idéia do baú, que, para nós, representava este vínculo: A minha história contida naquele baú juntamente com a história de outros tantos amigos queridos, os quais, muitos deles, não vejo desde aquela ocasião.

Em breve celebraremos o nosso reencontro, ocasião em que o baú deverá ser resgatado e reaberto. Retomaremos nossos pertences, símbolos daquela época bonita, e, sugiro, depositarmos novos objetos para que sejam resgatados no ano de 2.022.

Sinto que aquele baú tornou-se uma maneira simples de expressar a alegria de lembrar do passado, preservando nossa memória coletiva e reafirmando as cumplicidades definitivas que motivavam aqueles encontros semanais e que ainda hoje, dez anos mais tarde, nos une em torno dos valores cultivados desde então.

Que a chama da amizade sempre arda em nossos corações, e, como diz Fernando Anitelli, que possamos “Amanhecer brilhando mais forte”!

Ronei Costa Martins.